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"Entre a paz e a justiça, eu escolho a justiça".
(Roosevelt)

domingo, 5 de setembro de 2010

Candidato aprovado entre as vagas previstas no edital de concurso público: Direito líquido e certo de nomeação ou mera expectativa?

Caro leitor,

Penso que no Brasil, para se ter uma certa estabilidade financeira (licitamente, lógico), ou o cabra é jogador de futebol, artista da Globo, genro do Eike Batista, ou ocupante de cargo ou emprego público.

Muitos acabam investindo na última opção, a uma porque nem todos são bons de bola; a duas porque nem sempre é fácil unir os fatores talento e beleza para se ingressar na TV (como se todos tivessem isso!); a três porque, até onde se sabe, o Eike não tem filha (chamei só de Eike porque somos pessoas íntimas, chiques, frequentamos a mesma sauna... opa, brincadeira!).

Porém, nos termos do art. 37, II, da Constituição Federal, "a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração".

É por isso que os chamados "concurseiros" vem se multiplicando a cada momento, muito mais que coelho! É a confirmação da Teoria da Evolução de Charles Darwin: a CF/88 acabou com o "oba-oba", o número de vagas diminuiu, o de candidatos aumentou, a prova ficou mais difícil e, pela seleção natural, só passa quem está muito bem preparado.

Mas basta passar no concurso para se conquistar uma vida de sombra, ar condicionado e água fresca no setor público?

Nem sempre!

Em se tratando de cargo público, o provimento, ou seja, a investidura, se dará com a nomeação.

Portanto leitor, além de ser aprovado em concurso público, o candidato precisará ser nomeado.

Mas pode o candidato aprovado entre as vagas previstas no edital do concurso não ser nomeado?

Imagine o seguinte leitor: o município de Campinas/SP abre concurso para o preenchimento de 5 vagas de Procurador do Município Nível I, conforme edital. Você compra livros, se matricula em um curso preparatório, deixa de sair no fim de semana para estudar, já não toma banho, não se depila e nem corta o cabelo para não perder tempo, deixa de acompanhar a novela, não transa mais, vive à base de cafeina e chocolate, engorda 5 quilos, porém se prepara com muito empenho e afinco para o certame. Faz a prova, espera angustiado o resultado e... voilà, seu nome na lista dos aprovados. Posição: 5º lugar. Bateu na trave, mas entrou! A família faz a festa! Sua mãe prepara seu prato preferido, seu pai põe pra tocar aquele CD antigo (e, portanto, original) do Martinho da Vila, seus tios aparecem para te felicitar, todos estão orgulhosos e você não vê a hora de conquistar a autonomia financeira para sair de casa. Dia vai, dia vem. Meses vão, meses vem e nada de você ser nomeado! Nessa altura do campeonato, você já não aguenta mais assistir a Palmirinha Onofre e o Gotino, na TV. O prazo do concurso já está para vencer e pintou aquele medo de nunca ser investido no cargo. E agora, leitor?

Trata-se de direito líquido e certo a nomeação de candidato aprovado dentro no número de vagas previstas no edital ou não passa de mera expectativa de direito?
Repousa justamente nessa questão o objeto desta postagem.

O STJ vem adotando entendimento de que há direito subjetivo do candidato à nomeação e que o disposto em edital vincula a administração pública. Neste sentido:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – CONCURSO PÚBLICO – APROVAÇÃO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL – DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital do certame não tem mera expectativa de direito, mas verdadeiro direito subjetivo à nomeação para o cargo a que concorreu e foi classificado. 2. Precedentes: AgRg no RMS 30.308/MS, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 15.3.2010; RMS 30.459/PA, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 8.2.2010; RMS 27.508/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJe 18.5.2009. 3. A administração pratica ato vinculado ao tornar pública a existência de cargos vagos e o interesse em provê-los. Portanto, até expirar o lapso de eficácia jurídica do certame, tem o poder-dever de convocar os candidatos aprovados no limite das vagas que veiculou no edital, respeitada a ordem classificatória (RMS 27.311/AM, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 4.8.2009, DJe 8.9.2009). Recurso ordinário provido. (RMS 31611 / SP - 2ª Turma - Relator: Ministro Humberto Martins - Julgado em 04.05.2010).

Este que vos escreve pensa da mesma forma.

Não parece justo a administração pública abrir concurso para o preenchimento de 10 vagas, mas depois alegar que só necessita de 5! Por que não calculou isso antes?

Se o administrador foi um irresponsável, um incompetente (uma anta, sejamos sinceros!), não pode aquele que investiu seu tempo e dinheiro para a aprovação no certame ser prejudicado! Não parece crível que o edital vincule e estabeleça regras apenas para o candidato, mas não para a própria administração.

Assim, entendo pelo direito líquido e certo da nomeação daquele aprovado entre o número de vagas oferecidas em edital.


No entanto, o STF, por incrível que pareça, se posiciona no sentido oposto, ou seja, de que se trata de mera expectativa (vide RE 421938 AgR/DF e AI 381529 AgR/SP).

Mas, ainda assim, há uma luz no fim do túnel! Pode (assim esperamos!) esse entendimento vir a mudar.

O STF reconheceu repercussão geral em questão constitucional suscitada no Recurso Extraordinário 598.099/MS. Veja ementa:

"DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. 2. Direito líquido e certo à nomeação do candidato aprovado entre as vagas previstas no edital de concurso público. 3. Oposição ao poder discricionário da Administração Pública. 4. Alegação de violação dos arts. 5º, inciso LXIX e 37, caput e inciso IV, da Constituição Federal. 5. Repercussão Geral reconhecida."

Assim, visando a sedimentação da jurisprudência sobre o tema, o Pleno se manifestará sobre a existência ou não de direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados entre as vagas previstas em edital.

Portanto amigo "concurseiro", seja cauteloso - pelo menos por enquanto! Ao ser aprovado em concurso público, não vá comprar no cartão de crédito meia dúzia de ternos da Brookfield ou 18 bolsas da Victor Hugo! Seja prudente, invista-se no cargo primeiro. Em todo caso, torça para o Pleno se manifestar favoravelmente ao direito subjetivo do aprovado nas condições apontadas.

P.S.: O que foi dito e defendido aqui não se mostra compatível com o caso de "cadastro reserva", onde, naturalmente, se observará a necessidade da administração pública.

Por hoje é só!

Matricule seu filho na escolinha de futebol e boa sorte!

Abraço!

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